Por Juliana Biadolla
Advogada
Godeghese e Silva Advogados Associados
Não raramente, os contribuintes acabam por apurar créditos tributários, seja por recolhimentos indevidos ou realizados em montante superior ao devido. No âmbito federal, a compensação tributária encontra-se regulamentada por meio do art. 74 da Lei n° 9.430/1996, o qual prevê a possibilidade de o contribuinte compensar eventuais créditos tributários com quaisquer tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, mediante entrega de declaração de compensação — a chamada PER/DCOMP.
Tal direito à compensação, todavia, encontra-se claramente ameaçado em virtude de alterações promovidas no citado art. 74 da Lei nº 9.430/96, que culminaram na inclusão do parágrafo 17 ao referido dispositivo, instituindo a multa isolada de 50% sobre o débito objeto da declaração de compensação não homologada pela Receita Federal do Brasil.
Em linhas gerais, desde a inclusão do parágrafo 17 no artigo em questão, basta que o contribuinte tenha denegado seu pedido administrativo de homologação de compensação para que lhe seja exigido o pagamento da multa isolada de 50% sobre o débito objeto da compensação, independentemente da comprovação de má-fé.
Diante do total descabimento de tal imposição, inúmeros contribuintes insatisfeitos se socorreram ao Poder Judiciário, buscando afastar a exigência de tal multa.
Dentre os argumentos utilizados, está o de que a multa isolada configura evidente restrição do direito constitucional de petição, gerando um verdadeiro desestímulo aos contribuintes quanto ao exercício do legítimo direito à compensação, diante das reais chances de imposição da referida multa.
A exigência da multa isolada também importa em violação aos princípios da razoabilidade, da moralidade, da proporcionalidade, do devido processo legal, bem como do contraditório e da ampla defesa, tendo ainda efeito confiscatório. Além disso, tratando-se de evidente sanção, a multa somente poderia ser aplicada se evidenciada a prática de ato doloso pelo contribuinte, e não diante do mero indeferimento da compensação por decisão, vale lembrar, proferida pela própria Administração Pública.
Dadas as inúmeras violações ao ordenamento jurídico, os Tribunais Regionais passaram a afastar a imposição da multa isolada em casos de compensação não homologada, de forma que controvérsia chegou ao Supremo Tribunal Federal, por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 4.905 e, também, do Recurso Extraordinário n° 796.939/RS, no qual é declarada a repercussão geral.
Se, por um lado, o fisco defende a legitimidade da referida multa, sob o argumento de que a mesma teria como principal finalidade inibir abusos cometidos pelos contribuintes; por outro lado, a própria Procuradoria Geral da República — PGR — emitiu parecer reconhecendo a inconstitucionalidade de tal multa, salvo quando comprovada a má-fé do contribuinte.
Em abril de 2020, foi iniciado o julgamento do RE nº 796.939/RS, ocasião em que o relator, ministro Edson Fachin, se manifestou de maneira favorável aos contribuintes, propondo a seguinte tese: “É inconstitucional a multa isolada prevista em lei para incidir diante da mera negativa de homologação de compensação tributária por não consistir em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária”.
Tal julgamento, todavia, acabou sendo suspenso em virtude de pedido de vista, e, desde então, existe grande expectativa de retomada da análise da matéria pelo STF, prevista para este mês de junho de 2022.
O cenário atual aponta para um desfecho favorável aos contribuintes, que permanecem até hoje sofrendo com a imposição da multa isolada a cada compensação não homologada. Àqueles que se encontram nessa situação, é válido buscar a tutela do judiciário, seja para afastar a cobrança de multa aplicada ou mesmo para pleitear a restituição daquelas já indevidamente pagas, nos últimos cinco anos.
É importante alertar que, nos julgamentos mais recentes relacionados à matéria tributária, o Supremo Tribunal Federal acabou por modular os efeitos das decisões proferidas, inviabilizando em alguns casos a recuperação de valores pagos indevidamente. Tal modulação, historicamente, não atinge aqueles contribuintes que ingressaram com medida judicial até o julgamento da matéria pelo STF, razão pela qual reforçamos a pertinência de ponderar sobre o ajuizamento da medida judicial com brevidade.