Por Douglas Rogério Campanini
Consultoria Tributária – Impostos Indiretos
A Medida Provisória 927, editada no mês de março, abordou as medidas que poderiam ser adotadas pelas empresas para a preservação do emprego e renda dos trabalhadores em razão dos reflexos trazidos pelo coronavírus.
Uma das medidas permitidas pela norma foi a alteração do regime de trabalho do empregado de presencial para o trabalho remoto e/ou à distância.
Apesar dessa modalidade já existir em nosso ordenamento trabalhista, a MP também estabeleceu algumas premissas e obrigações que os empregadores devem observar para que os empregados possam exercer as suas funções fora do seu local de trabalho.
Como exemplo, citamos as disposições constantes nos §§ 3º e 4º do artigo 4º da MP:
§ 3º As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, pela manutenção ou pelo fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho a distância e ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado serão previstas em contrato escrito, firmado previamente ou no prazo de trinta dias, contado da data da mudança do regime de trabalho.
§ 4º Na hipótese de o empregado não possuir os equipamentos tecnológicos e a infraestrutura necessária e adequada à prestação do teletrabalho, do trabalho remoto ou do trabalho a distância:
I – o empregador poderá fornecer os equipamentos em regime de comodato e pagar por serviços de infraestrutura, que não caracterizarão verba de natureza salarial;
De acordo com a redação do §4º supra, na hipótese de o profissional não possuir os equipamentos e infraestrutura necessária para o desenvolvimento da atividade, cabe ao empregador conceder as condições necessárias para tal, arcando com todos os gastos necessários.
Nesse ponto, as empresas estão dispendendo gastos com locação de laptop, impressoras, frete para entrega dos equipamentos nas residências, serviços adicionais de empresas de tecnologia da informação para configuração desses equipamentos, custos com assistência técnica e licenças adicionais de software, dentre outros.
Analisando esses gastos sobre a ótica de créditos de PIS e Cofins, temos que seriam permitidas a tomada de créditos sobre os gastos com locação de laptop e impressoras, eis que se trata de locação de equipamentos que serão utilizados nas atividades da empresa.
A Receita Federal do Brasil, por meio da Solução de Consulta 02/2016, proferiu o entendimento de que a legislação autoriza o crédito em relação às despesas de aluguel de equipamentos, desde que sejam comprovadamente utilizados nas atividades da empresa, independentemente da localidade em que serão utilizados os bens.
A Câmara Superior de Recursos Fiscais – CSRF, por meio do Acórdão 9303-006.730) também já se posicionou nesse mesmo sentido.
Já em relação aos demais dispêndios, será uma tarefa árdua avaliar se estes se enquadram como essenciais e ou relevantes para fins do desenvolvimento das atividades da empresa, conforme decidido pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ – no processo em que se discutiu o conceito de insumo (REsp 1.221.170/PR).
A análise individualizada de cada caso será fundamental para essa tomada de decisão.
Isso porque, se for constatado que os dispêndios acima mencionados se referem a um profissional da empresa que atua no departamento de controle de qualidade, ou seja, ligado diretamente ao processo de fabricação dos produtos, deve ser analisado se esses gastos apresentam todas as características geradoras de crédito constantes na legislação, em especial os itens 145 a 152 do Parecer Normativo Cosit 05/2018.
Em um cenário totalmente atípico que estamos atravessando, constata-se que as empresas também estão promovendo gastos não usuais, mas que em razão do momento vivenciado pode ser uma despesa necessária e/ou fundamental para a manutenção do seu negócio em funcionamento, mesmo que de forma parcial.
Em razão do exposto, o que já se demonstrava uma tarefa muito complexa e de difícil harmonização se tornará uma etapa ainda mais relevante no universo tributário das empresas.
Nesse contexto, estas devem analisar, com cautela e de acordo com a particularidade do seu negócio, os gastos incorridos neste período que podem ser objeto de aproveitamento de créditos, com a única certeza de que deverão possuir vasto material probatório para justificar a sua essencialidade e relevância, preparando-se eventualmente para uma “boa discussão técnica” com o fisco.