Por Daniel Cristofi
Sócio-Supervisor da Consultoria Trabalhista e Previdenciária
Athros Auditoria e Consultoria + SFAI
Agosto de 2023
A título introdutório, a Lei nº 14.611 de 03 de julho de 2023 veio reforçar dispositivos já existentes no combate à discriminação salarial entre mulheres e homens, além de demais discriminações decorrentes de etnia, raça, nacionalidade e idade.
O que diz a CLT sobre o tema:
“Art. 372 – Os preceitos que regulam o trabalho masculino são aplicáveis ao trabalho feminino, naquilo em que não colidirem com a proteção especial instituída por este Capítulo.
Art. 373-A. Ressalvadas as disposições legais destinadas a corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho e certas especificidades estabelecidas nos acordos trabalhistas, é vedado:
I – publicar ou fazer publicar anúncio de emprego no qual haja referência ao sexo, à idade, à cor ou situação familiar, salvo quando a natureza da atividade a ser exercida, pública e notoriamente, assim o exigir;
II – recusar emprego, promoção ou motivar a dispensa do trabalho em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez, salvo quando a natureza da atividade seja notória e publicamente incompatível;
III – considerar o sexo, a idade, a cor ou situação familiar como variável determinante para fins de remuneração, formação profissional e oportunidades de ascensão profissional;
IV – exigir atestado ou exame, de qualquer natureza, para comprovação de esterilidade ou gravidez, na admissão ou permanência no emprego;
V – impedir o acesso ou adotar critérios subjetivos para deferimento de inscrição ou aprovação em concursos, em empresas privadas, em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez;
VI – proceder o empregador ou preposto a revistas íntimas nas empregadas ou funcionárias.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não obsta a adoção de medidas temporárias que visem ao estabelecimento das políticas de igualdade entre homens e mulheres, em particular as que se destinam a corrigir as distorções que afetam a formação profissional, o acesso ao emprego e as condições gerais de trabalho da mulher.
Art. 461. Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, no mesmo estabelecimento empresarial, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, etnia, nacionalidade ou idade.
Parágrafo 1º Trabalho de igual valor, para os fins deste Capítulo, será o que for feito com igual produtividade e com a mesma perfeição técnica, entre pessoas cuja diferença de tempo de serviço para o mesmo empregador não seja superior a quatro anos e a diferença de tempo na função não seja superior a dois anos.
Parágrafo 2º Os dispositivos deste artigo não prevalecerão quando o empregador tiver pessoal organizado em quadro de carreira ou adotar, por meio de norma interna da empresa ou de negociação coletiva, plano de cargos e salários, dispensada qualquer forma de homologação ou registro em órgão público.
Parágrafo 3º No caso do § 2o deste artigo, as promoções poderão ser feitas por merecimento e por antiguidade, ou por apenas um destes critérios, dentro de cada categoria profissional.”
O que diz a Constituição Federal de 1988:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;”
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XX – proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei;
XXX – proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;”
Mesmo com os dispositivos legais existentes, seja na CLT ou na Constituição Federal, os dados estatísticos mostram que ainda há desigualdade salarial e disparidade na ocupação de postos de trabalho de gestão e diretoria das empresas, então a Lei veio para dar mais transparência no empenho das empresas em reduzir desigualdades e contratações, bem como punir com mais rigor quem não promove tais práticas. A Lei em destaque trouxe penalidades mais contundentes, bem como mecanismos de fiscalização repassados aos empregadores através de novas obrigações acessórias.
Conforme disposto na referida Lei, as empresas deverão:
– Criar formas de demonstrar critérios remuneratórios. Neste ponto da Lei, entendemos que a empresa deva ter plano de cargos e salários devidamente implementado e divulgado aos colaboradores, para que tenham conhecimento (transparência) de que estão recebendo a remuneração sem nenhuma defasagem ou discriminação.
– Realizar fiscalizações internas e comprovadas, no sentido de evitar discriminações salariais no ato das contratações, demonstrando dar oportunidade a homens e mulheres, independentemente do estado civil, ou se possuem filhos.
– Criar canais, de preferência anônimos, para que os colaboradores possam denunciar eventuais casos de discriminação ou equiparação salarial.
– Capacitar os gestores para que esses estejam alinhados com os objetivos da Companhia, demonstrando que estão aptos a reduzir discriminações salariais e que as oportunidades de carreira entre homens e mulheres são proporcionais.
– Promover incentivos à capacitação profissional, principalmente para mulheres, com o objetivo de que possuam as mesmas condições de ascensão que os homens.
– Para empresas com mais de 100 empregados, publicar semestralmente relatórios anônimos demonstrando de forma objetiva os critérios de remuneração e os resultados dos trabalhos realizados para redução da discriminação salarial, bem como, para cargos de gestão, comparação entre homens e mulheres, por remuneração e ocupação por níveis de funções, além de outras possíveis discriminações decorrentes das elencadas na CLT e CF.
Caso a empresa com mais de 100 empregados não publique o relatório semestral citado, poderá ser autuada, e o valor da multa corresponderá a até 3% da folha de salários do empregador, limitada a 100 salários mínimos.
A multa também não impede as demais sanções aplicáveis em casos de discriminação salarial entre homens e mulheres.
Devido à recente publicação da Lei, ainda não há informações suficientes sobre como serão publicados, semestralmente, os relatórios supramencionados. Logo, nossa recomendação é que as empresas iniciem as medidas trazidas pela Lei, elaborando os relatórios de remuneração, a fim de estar de acordo com a legislação vigente.
A citação de que os processos fiscalizatórios serão incrementados não parece ser suficiente para garantir a eficácia da Lei. Assim, aguarda-se a adoção dos devidos protocolos referentes à fiscalização, a serem estabelecidos por atos complementares do governo, conforme consta do Artigo 6º.