Leonardo de Almeida
Socio Gerente – Tributos Indiretos
Athros Auditoria e Consultoria + SFAI
A classificação fiscal (ou código NCM – Nomenclatura Comum do Mercosul) atribuída às mercadorias transacionadas pela empresa afeta diretamente a carga tributária incidente em suas operações. O código NCM também é base para estabelecer direitos de defesa comercial, utilizado em dados estatísticos de importação e exportação, na identificação de mercadorias para efeito de regimes aduaneiros especiais, de tratamentos administrativos, de licença de importação, dentre outros.
É através da classificação fiscal que se identifica, por exemplo, as alíquotas do IPI e do Imposto Importação. Além disso, diversas regras específicas de tributação de ICMS, PIS e COFINS estão atreladas ao código NCM.
Atribuir uma classificação fiscal incorreta à determinada mercadoria pode representar a exposição a penalidades pelo enquadramento incorreto, contingências atinentes a falta de pagamento do tributo, ou mesmo o dispêndio de recursos para o pagamento de tributos superiores aos que seriam efetivamente devidos na operação da empresa.
No CARF (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) as discussões sobre classificação fiscal são inúmeras. Como exemplo podemos citar o Acórdão 3402-001.700:
Evidenciada, pela decisão recorrida, a correção da classificação utilizada pela Recorrida, referendada por laudo técnico do Instituto Nacional de Tecnologia, no âmbito de sua competência, concluindo que o produto comercialmente denominado “Desodorante Leite de Rosas” é um desodorante, classificando-se, portanto, na posição 3307.20.10 de conformidade com as Regras Gerais de Classificação n° 3.a, constante da NESH e notas explicativas da posição e do capítulo respectivo, nega-se provimento ao recurso de ofício para manter a decisão recorrida que cancelou o lançamento.
Na ocasião o fisco federal lavrou um Auto de Infração milionário alegando “erro de classificação fiscal e/ou erro de alíquota, tendo em vista que a empresa utilizou a alíquota de 7% (sete por cento), quando o correto seria 22% (vinte e dois por cento), em relação ao produto LEITE DE ROSAS”. A classificação utilizada pela empresa, e que prevaleceu ao final do processo, foi a de desodorante, e a pretendida pelo fisco referia-se à loção embelezadora.
O domínio das regras pertinentes à classificação fiscal de mercadorias e a sua correta aplicação permite também às empresas uma melhor eficiência tributária. Não são poucos os casos de planejamento tributário tendo como base a classificação fiscal.
Tratam-se de empresas que mudam a quantidade de produto em sua embalagem ou fazem pequenas modificações na composição do produto, possibilitando o seu enquadramento num código NCM com menor carga tributária.
Ocorre que definir a classificação fiscal de uma mercadoria não é uma tarefa simples. Para tanto é necessária uma análise técnica do produto perante o Sistema Harmonizado de Designação e de Codificação de Mercadorias, que consolida Normas Explicativas do Sistema Harmonizado – NESH (Instrução Normativa RFB 2.269 de 29.12.2023).
É pela NESH que se analisa e interpreta as Nomenclaturas existentes no Sistema Harmonizado – SH. Nela há especificações técnicas sobre cada produto / código NCM (com seis dígitos – convenção internacional). Os dois últimos dígitos são definidos pelo Mercosul.
Para fins de esclarecer os conceitos que devem ser utilizados no enquadramento dos produtos, a classificação será regida pelas Regras Gerais para Interpretação do Sistema Harmonizado – RGI da NESH.
A tabela da NCM ordena as mercadorias de acordo com o seu grau de elaboração, iniciando pelos animais vivos e terminando com as obras de arte, passando por matérias-primas e produtos semi-acabados. Segundo levantamento da RFB, a tabela possui mais de 10.000 códigos NCM; cada uma representando um produto ou grupo de produtos[1].
Essa é uma pequena amostra das normas a serem observadas para definir a classificação fiscal, pois existem ainda outras normas da RFB e jurisprudências que podem ser necessárias nesse processo.
Este contexto pode remeter a necessidade de envolvimento de um profissional da área tributária. Entretanto, para a correta análise da NESH e determinação da classificação fiscal do produto, é necessário conhecimento detalhado e específico do produto, isto porque o código NCM pode ser definido em razão de características como composição química, ingredientes empregados, processo de fabricação, aplicação do produto, dentre outros.
Por isso somos da opinião de que a responsabilidade para determinar a classificação fiscal das mercadorias numa Companhia não é da área tributária ou da engenharia, mas sim uma tarefa conjunta. O profissional da área tributária terá condições de interpretar e aplicar as normas corretamente e até mesmo de identificar oportunidades, mas sem o conhecimento especializado sobre a mercadoria, este profissional está sujeito a enquadrar incorretamente tal mercadoria nas disposições da NESH.
Mas com a reforma tributária, será que esse tema deixará de ser uma preocupação para as empresas?
A resposta é que, para a maioria das empresas, esse tema deverá inspirar cuidados mesmo após a reforma.
Isso porque, dentre outros fatores, o código da NCM continuará sendo base para identificar a tributação do produto. Exemplificamos:
- – O Imposto de Importação não foi contemplado pela reforma;
- – O IPI continuará com alíquota positiva para aqueles produtos que também são fabricados na Zona Franca de Manaus;
- – O PL 68/2024 em tramitação no Senado utiliza o código NCM para identificar a carga tributário em diversas situações, tais como:
- 1) Os produtos que ficarão sujeitos ao Imposto Seletivo (Anexo XVIII do PL 68/24);
- 2) Os produtos da cesta básica que terão redução a zero do IBS e CBS (Anexo I do PL 68/24);
- 3) Os alimentos e produtos de higiene pessoal e limpeza que terão redução de 60% do IBS e CBS (Anexos VII e VIII do PL 68/24);
- 4) Dentre outros.
Dessa forma, com ou sem a reforma tributária, é importante que as empresas estejam seguras de que estão utilizando a NCM adequada para as mercadorias que comercializam.