Por Douglas Rogério Campanini
Consultoria Tributária – Impostos Indiretos
O acúmulo de créditos tributários pelas empresas é um tema que, há muito tempo, aflige os administradores dos recursos financeiros das companhias.
Isso porque é consabido que os estados, em razão das suas condições financeiras, acabam por impor inúmeras obrigações tributárias e/ou regras restritivas para a sua devolução aos contribuintes, ocasionando a complexidade de atendimento à todas as solicitações e, por conseguinte, na morosidade na monetização.
Esse recurso afeta diretamente o capital de giro dos negócios e os contribuintes sempre são questionados, sejam pelos auditores independentes ou pelos investidores do exterior, qual a expectativa de utilização desses ativos, com o receio de que se tratem de ativos “podres” ou que possuem baixa previsibilidade de utilização.
Apesar de todos os problemas existentes, é importante destacar que essas dificuldades e/ou restrições impostas pelos estados e, até mesmo, a eventual ausência de normas estaduais sobre a sua operacionalização tema não deveria afetar a monetização dos acúmulos de créditos de ICMS derivados das operações de exportação.
Isso porque o inciso II do §1º do artigo 25 da Lei Complementar 87/96 estabelece que os saldos credores acumulados de ICMS decorrentes de exportação de produtos podem, na proporção desses saldos em razão das operações totais realizadas pelas empresas, serem transferidos para outros contribuintes localizados no mesmo estado.
Mesmo com essa disposição expressa prevista na legislação supramencionada, alguns estados sequer preveem essa possibilidade em seus diplomas normativos, e outros acabam impondo restrições para a sua realização.
Como exemplo podemos citar o estado de São Paulo que, no artigo 82 do Regulamento do ICMS[1], impõe vedação para as empresas utilizarem crédito acumulado por empresa que possua débito fiscal, inclusive se parcelado.
Haja vista que a Lei Complementar 87/96 garantiu aos contribuintes a sua efetiva utilização sem a imposição de restrições, empresas têm acionado o poder judiciário para efetivar essas transações com a maior celeridade possível.
O Superior Tribunal de Justiça – STJ, ao analisar o tema, possui posição consolidada no sentido de que o artigo 25 da Lei Complementar 87/96 é autoaplicável, independendo de norma estadual sobre o tema, e no caso de existência de normas que restrinjam o direito dos contribuintes, estas devem ser, de plano, afastadas.
Dessa forma os contribuintes que possuem créditos acumulados de ICMS decorrentes de exportação têm conseguido, com o amparo do poder judiciário, superar esses entraves e morosidade na sua utilização e monetizado esses valores com mais agilidade.
Como exemplo, reproduzimos a ementa de duas decisões do STJ:
PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. MEDIDA CAUTELAR. ICMS. APROVEITAMENTO DE CRÉDITOS. REQUISITOS PARA O DEFERIMENTO DA TUTELA DE URGÊNCIA NÃO DEMONSTRADOS. PEDIDO LIMINAR SATISFATIVO.
- A fumaça do bom direito foi demonstrada, tendo em vista a aplicabilidade imediata do art. 25, § 1º, cumulado com o art. 3º, II e parágrafo único, da Lei Complementar 87/1996, prescindindo, portanto, de regulamentação estadual, o que assegura à requerente o aproveitamento dos créditos acumulados de ICMS, não se lhe aplicando a restrição contida no art. 82 do RICMS/SP/2000. Nesse sentido: AgRg no AREsp 151.708/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 5/6/2012, DJe 14/6/2012. 2. Todavia, a questão não pode ser dirimida em sede de liminar, porquanto pretende a agravante a possibilidade de apropriação e transferência de créditos acumulados pelo próprio interessado, sem a obrigatória intervenção da administração, o que denota procedimento eminentemente satisfativo. Agravo regimental improvido. (AgRg na MC 22.297/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/06/2014, DJe 27/06/2014)
TRIBUTÁRIO. ICMS. LC N. 87/96. TRANSFERÊNCIA A TERCEIROS DE CRÉDITOS ACUMULADOS EM DECORRÊNCIA DE OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO. ART. 25, § 1º, DA LC N. 87/96. NORMA DE EFICÁCIA PLENA. DESNECESSIDADE DE EDIÇÃO DE LEI ESTADUAL REGULAMENTADORA. INVIABILIDADE DE VEDAÇÃO À TRANSFERÊNCIA. AGRAVO NÃO PROVIDO.
- “Por ser autoaplicável o § 1º do art. 25 da Lei Complementar n. 87/96, e sendo os créditos oriundos de operações disciplinadas no art. 3º, inciso II, do mesmo normativo, “não é dado ao legislador estadual qualquer vedação ao aproveitamento dos créditos do ICMS, sob pena de infringir o princípio da não-cumulatividade, quando este aproveitamento se fizer em benefício de qualquer outro estabelecimento seu, no mesmo Estado, ou de terceiras pessoas, observando-se para tanto a origem no art. 3º” (RMS 13544/PA, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ 2/6/03). 2. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 187.884/RS, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/06/2014, DJe 18/06/2014)
Insta salientar que a adoção desse procedimento não retira o direito do estado em, exercendo as suas prerrogativas, fiscalizar às operações realizadas pelos contribuintes para averiguar se o crédito apropriado possui todas as formalidades legais para a sua constituição.
Nesse contexto, estabelecimentos de empresas que acumulam créditos de ICMS decorrentes de exportação podem, independentemente do estado em que estejam estabelecidos, avaliar as disposições constantes da legislação estadual sobre o tema e, esbarrando em restrições e/ou disposições conflitantes para a sua transferência para terceiros, acionar o poder judiciário para valer-se desse direito e, por derradeiro, transformar este ativo “tributário” em “financeiro”.
[1] Decreto 45.490/00