Por Luciano Nutti
Sócio-Diretor Consultoria – Impostos Diretos
Athros Auditoria e Consultoria
A dedutibilidade ou não das gratificações e participações nos lucros pagas a dirigentes e administradores sempre foi um ponto polêmico em nosso ordenamento jurídico, em especial, quando tais dirigentes ou administrares são também empregados (celetistas).
Isso porque se por um lado temos normas tratando da indedutibilidade dessas despesas pagas a dirigentes e administradores, por outro, há normas específicas que tratam da dedutibilidade quando pagas a empregados.
O art. 315 do RIR/18 (baseado no art. 45 da Lei 4.506/64 e art. 58 do Decreto-Lei 1.598/77) dispõe que “Não serão dedutíveis como custos ou despesas operacionais as gratificações ou as participações no resultado, atribuídas aos dirigentes ou aos administradores da pessoa jurídica”.
As gratificações pagas a empregados, por sua vez, são perfeitamente dedutíveis na determinação do lucro real (IRPJ), o mesmo se aplicando à base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL. Nesse sentido, a Instrução Normativa nº 1.700/17, a qual consolida normas relativas ao IRPJ e à CSLL, em seu artigo 80 determina que “A despesa com o pagamento de gratificação a empregados poderá ser deduzida na apuração do lucro real e do resultado ajustado, independentemente de limitação”.
No que tange à Participação nos Lucros paga a empregados, são igualmente dedutíveis, desde que atendidos os preceitos e regras constantes da Lei 10.101/2000.
Cabe aqui uma observação importante quanto ao momento de dedutibilidade. Não necessariamente a dedutibilidade se dá apenas no efetivo pagamento das gratificações ou participações nos lucros, mas sim no momento em que os valores se tornam líquidos e certos, ou seja, por competência, obviamente com a exceção de quando representam mera provisão.
Temos aqui um ponto interessante em que a legislação tributária necessariamente diferencia dirigentes e administradores dos empregados, partindo de uma premissa totalmente equivocada de que administradores não podem ser empregados. Ora, desde que atendidas as características de subordinação e demais requisitos da legislação trabalhista, não há dúvidas de que se caracterizam como empregados.
Em julgamento ocorrido em junho de 2017, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) decidiu sobre o cancelamento de autuação lavrada contra determinado contribuinte, a qual exigia a contribuição previdenciária sobre PLR paga a membros do conselho de administração pela suposta ausência da condição de emprego nas funções exercidas pelos administradores. O entendimento do Carf foi no sentido de que não haveria qualquer vedação legal, em nosso ordenamento jurídico, para que os administradores fossem considerados empregados e, por consequência, não poderia o Fisco presumir que os membros do conselho não seriam empregados.
Embora o Carf não tenha se posicionado sob a ótica de dedutibilidade das despesas para fins de IRPJ e CSLL, pois o enfoque era outro, é importante a citação, considerando que que o Carf reconheceu que nada obsta que o administrador tenha vínculo empregatício em sua essência.
Antes de adentrarmos na polêmica que envolve a dedutibilidade das gratificações e participações pagas a dirigentes e administradores na determinação do lucro real (IRPJ), é importante destacar que são perfeitamente dedutíveis na base de cálculo da CSLL, pelo simples fato de não haver dispositivo legal que trate da indedutibilidade nesse caso.
Não é incomum nos depararmos com empresas que ainda adicionam as gratificações e participações pagas a dirigentes e administradores nas duas bases de cálculo (IRPJ e CSLL), muitas vezes por interpretar de forma equivocada o artigo 57 da Lei 8.981/1995, o qual determina que “aplicam-se à Contribuição Social sobre o Lucro as mesmas normas de apuração e de pagamento estabelecidas para o imposto de renda das pessoas jurídicas”.
Indubitavelmente, as regras gerais são as mesmas (regime de apuração adotado, forma de apuração e pagamento, etc.), mas isso não significa que não haja peculiaridades em suas respectivas bases de cálculo.
Inclusive, nesse sentido, na Tabela de Adições constantes do anexo I da IN RFB 1.700/2017, tais valores constam como não aplicáveis para a CSLL (item A.163).
A jurisprudência também é favorável. Vejamos uma das inúmeras decisões sobre dedutibilidade dessas despesas na base de cálculo da CSLL:
CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO – CSLL
Ano-calendário: 2012
DESPESAS. GRATIFICAÇÃO A ADMINISTRADORES. DEDUTIBILIDADE.
Para fins de apuração da base de cálculo da CSLL, são dedutíveis as gratificações ou participações no resultado atribuídas aos dirigentes ou administradores da pessoa jurídica. (Proc. 16327.720756/2016-00, Ac. 1301003.760, Rec. Voluntário, CARF, 1ª S, 3ª C, 1ª TO, j. 19/03/2019)
Nesse cenário, considerando a indiscutível dedutibilidade para fins de determinação da base de cálculo da CSLL, resta-nos então avaliar a questão da dedutibilidade dessas despesas para fins de determinação do lucro real (IRPJ).
O conceito de administrador é demasiadamente antigo. A Instrução Normativa SRF nº 2 de 12/09/1969 já dispunha que administrador “é a pessoa que pratica, com habitualidade, atos privativos de gerência ou administração de negócios da empresa, e o faz por delegação ou designação de assembleia, de diretoria ou de diretor”.
Interessante notar, contudo, que referida IN fez uma exclusão muito clara a essa conceituação. Vejamos:
“131. São excluídos da conceituação do inciso anterior, os empregados que trabalham com exclusividade, permanente, para uma empresa, subordinados hierárquica ou juridicamente e, como meros prepostos ou procuradores, mediante outorga de instrumento de mandato, exerçam essa função cumulativamente com as de seus cargos efetivos e percebam remuneração ou salário constante do respectivo contrato de trabalho, provado com a Carteira Profissional.”
Conforme anteriormente mencionado, desde que atendidos os requisitos legais para dedutibilidade, é indiscutível que as gratificações e participações nos lucros pagas ou creditadas a empregados, exceto quando se caracterizarem como provisões, são perfeitamente dedutíveis na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL.
Neste esteio, considerando que muitos dirigentes e administradores são contratados em regime de CLT e atendem os atributos de subordinação e demais requisitos que os caracterizam como empregados da Pessoa Jurídica, há bons argumentos para defender a dedutibilidade das despesas com gratificação e participação nos lucros nesses casos.
Obviamente, na hipótese de dirigentes ou administradores, ainda que celetistas, que não atendam a esses requisitos, a dedutibilidade certamente ficaria comprometida. Ainda que haja argumentos para sustentar a dedutibilidade também nesses casos, tais argumentos certamente seriam mais vulneráveis.
Por fim, considerando as peculiaridades existentes, cada situação deve ser analisada de forma isolada, considerando os poderes efetivos dos dirigentes e administradores, em especial quanto ao atendimento ou não dos atributos de subordinação e demais requisitos impostos pela legislação trabalhista, objetivando o adequado tratamento tributário dessas despesas.