Por Danila Maria Bernardi Aranon
Sócia-Diretora BPO
Athros Auditoria e Consultoria
Após anos de discussão no plano teórico, a transação tributária foi instituída no ano de 2019 pela Medida Provisória nº 899, que, no ano seguinte, foi convertida na Lei 13.988, a qual dispôs as premissas para que a Receita Federal do Brasil (RFB) e a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) pudessem negociar seus créditos tributários com os devedores, quando for de interesse público.
Certamente, a crise financeira que atingiu o país com a pandemia foi um grande impulso para que referida modalidade de quitação de dívidas saísse do papel e fosse colocada em prática, principalmente, para incentivar a arrecadação, manter viva as empresas para a preservação do emprego e pôr fim a inúmeros litígios tributários.
A regulamentação das transações, tais como: i) devedores alvos; ii) forma de parcelamento; iii) descontos aplicados e iv) prazo de adesão, será sempre publicada por meio de editais ou portarias do órgão competente.
Uma das principais premissas do acordo de transação tributária são as modalidades previstas. A Lei nº 13.988/20 determina que haverá modalidade por adesão e por acordo individual.
A modalidade por adesão se aplica normalmente as cifras de pequeno valor, em que é determinada a forma de parcelamento e o desconto aplicado. Essa modalidade, pouco se diferencia do que já conhecemos de parcelamentos excepcionais
No entanto, há a previsão para grandes devedores, do acordo individual de transação.
A aludida modalidade permite que os devedores possam negociar diretamente com uma comissão formada pela PGFN e SRFB, os descontos aplicados, o fluxo de pagamento da dívida conforme sua capacidade contributiva e em contrapartida deve oferecer garantias para que o acordo seja firmado.
Todas as informações dos acordos estarão disponíveis para consulta nos sites dos órgãos competentes para consulta, no intuito de prezar pela transparência das negociações.
A PGFN foi o órgão precursor na implantação dessa nova modalidade de quitação de dívidas. Desde 2019, o referido órgão vem regulamentando acordos para situações especificas, como débitos referentes a pagamento de PLR, amortização de ágio, dívida ativa suspensa por decisão judicial há mais de 10 anos, Funrural, débitos de difícil recuperação ou irrecuperáveis, dentre outras.
Ao contrário do movimento feito pela PGFN, a RFB apenas adotou os acordos de transação neste ano de 2022 e iniciou esta nova era de quitação de dívidas com débitos oriundos de contencioso administrativo.
Embora já existisse editais publicados para a quitação de débitos oriundos do contencioso administrativo, recentemente, foi publicada a Portaria RFB nº 247, a qual traz toda a regulamentação dos acordos para débitos não inscritos em dívida ativa.
Tanto na RFB quanto na PGFN, as adesões são efetuadas de forma eletrônica pelos portais E-Cac e Regularize, respectivamente, com exceção feita aos acordos individuais, os quais são negociados em reuniões entre os envolvidos.
Dessa forma, os devedores interessados em negociar suas dívidas devem consultar os canais supracitados para verificar o procedimento de formalização dos acordos.
Como há peculiaridades entre os acordos da RFB e da PGFN, detalharemos as premissas segregadas por órgão.
- Acordos da Receita Federal do Brasil
Os débitos de pequeno valor (até 60 salários mínimos) e os débitos de difícil recuperabilidade oriundos de contencioso tributário, poderiam ser negociados com descontos até 30/11/2022 junto ao portal E-cac.
Todavia, conforme mencionado acima, houve a publicação em 22/11, da Portaria nº 247, a qual traz toda a regra matriz para que os acordos sejam firmados, mas para cada transação haverá a publicação de um edital que deverá conter, o prazo de adesão, os critérios para a elegibilidade dos créditos tributários, vedações, descontos a serem aplicados, entre outros.
Dessa forma, traremos aqui alguns pontos importantes da regra matriz.
Serão modalidades de transação dos débitos em contencioso administrativo fiscal:
- Transação por adesão à proposta da RFB;
- Transação individual proposta pela RFB; e
- Transação individual proposta pelo devedor.
Para adesão a qualquer modalidade mencionada, o devedor deverá desistir de impugnação, recurso e manifestação de inconformidade que verse sobre os débitos transacionados.
O desconto concedido deverá ser até o limite de 65% da dívida, sem dedução do montante principal devido.
Também há a previsão para a utilização do prejuízo fiscal e base negativa da CSLL limitado a 70% do saldo remanescente (após a dedução dos descontos). Nesse caso, poderá ser descontado o valor principal.
O prazo de parcelamento está limitado a 120 meses, exceto para ME e EPP que se estende até 145 meses.
Ressaltamos que as regras supracitadas são os limitadores impostos pela regra matriz, mas a regulamentação de cada caso dependerá dos editais publicados à época.
Ademais, para débitos de entre R$1 milhão e R$10 milhões haverá a possibilidade de elaborar um acordo de transação simplificado, em que o devedor terá direito de propor a forma de quitação, respeitando as regras matrizes.
Os devedores cujos débitos sejam superiores a R$10 milhões poderão propor acordo individual, que será negociado com a equipe destinada para esse projeto.
Os acordos individuais somente terão início em janeiro/2023.
- Acordos da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional
Tendo em vista que a PGFN já vem negociando seus créditos tributários pela aplicação dos acordos de transação desde 2019, há vários já regulamentados e disponíveis no Portal Regularize.
Segue abaixo quadro resumo de alguns acordos em vigência. Lembrando que não é um quadro exaustivo e que os detalhes não estão aqui dispostos:
Acordo | A quem se destina? | Benefícios Concedidos e prazo para pagamento | Prazo para adesão |
Transação da Dívida Ativa do FGTS | Empregador com dívida ativa do FGTS até o valor consolidado de R$1 milhão | Descontos de até 70% e 144 parcelas (dependerá o perfil do empregador e dívida) | 30/12/2022 |
Programa Emergencial de Retomada do setor de eventos — Perse | Pessoas jurídicas que exercem atividade econômica ligada ao setor de eventos | Descontos de até 100% do valor de multa, juros e encargos e 145 parcelas (Débitos previdenciários – 60 meses) | 30/12/2022 |
Programa de Regularização do Simples Nacional | MEI, ME e EPP | 1% de entrada do valor da dívida em até 8 parcelas, descontos de até 100% do valor de multa, juros e encargos e 137 parcelas do saldo remanescente | 30/12/2022 |
Transação de Pequeno Valor | Pessoas jurídicas com dívidas de até 60 salários mínimos, e inscritos em dívida ativa a mais de 01 ano | 5% de entrada do valor da dívida em até 5 parcelas, descontos de 30% a 50% do valor total e até 55 meses para pagar o saldo remanescente | 30/12/2022 |
Quita PGFN para Negociar Débitos Irrecuperáveis ou de Difícil Recuperação | Pessoas jurídicas que possuam débitos irrecuperáveis ou de difícil recuperação | Desconto de 100% dos acréscimos legais, limitado a 65% do total da dívida. Entrada de 30% do valor já descontado em até seis meses. O saldo final pode ser quitado com prejuízo fiscal (PF) e base negativa da CSLL (BN) | sem prazo determinado |
Acordo de Transação Individual Simplificado | Pessoas jurídicas que possuam débitos de R$1milhão a R$10 milhões | O devedor apresenta proposta com o desconto e plano de pagamento, dentro da sua capacidade contributiva e respeitando os limites de até 65% da dívida e 120 meses (Não pode utilizar PF e BN) | sem prazo determinado |
Acordo de Transação Individual | Pessoas jurídicas que possuam débitos acima de R$10 milhões | O devedor deverá propor o acordo e discutir com a equipe destinada ao projeto | sem prazo determinado |
A transação tributária é um instrumento de negociação que o Governo Federal tem em mãos, com o intuito de recorrer a ele quando se observar situações atípicas que requerem uma intervenção mais forte na economia para minimizar impactos negativos de arrecadação, de sustentabilidade de empresas e consequentemente de empregos.
Entre os profissionais que se envolveram diretamente na implantação dos acordos de transação, há esperança de que nasça uma nova era para a quitação de débitos, em que o devedor terá voz e será ouvido quanto sua real necessidade, que possa comprovar a sua capacidade contributiva e de acordo com ela, determinar um plano de pagamento que possa de fato ser cumprido.
Cabe aos devedores observar e acompanhar todos os acordos que serão regulamentados para que possam se manter em dia com seus compromissos fiscais, pois a mera falta de uma Certidão Negativa de Débitos pode impedir a obtenção de crédito junto a terceiros quando necessário, participação em licitações e negociação de prazos de pagamento, prejudicando assim seu fluxo financeiro, rentabilidade e até produtividade.
Há uma grande expectativa entre os defensores dos acordos de transação que os contribuintes não ficarão mais à mercê da instituição de parcelamentos especiais para a quitação de suas dívidas, o que será de grande valia para os bons pagadores que por vezes se veem em apuros por situações alheia a sua vontade, como foi o caso indiscutível da pandemia.