Leonardo de Almeida
Consultor Tributário
Não é novidade que a definição do termo “insumo” para fins de créditos de PIS e Cofins é um tema objeto de muitas discussões.
A decisão do STJ proferida em fevereiro de 2018 não esgota o assunto, mas foi um grande avanço no sentido de trazer diretrizes aos contribuintes que precisam apurar suas contribuições.
Inclusive, em virtude desse posicionamento do STJ, a Receita Federal publicou o Parecer Normativo Cosit nº 5/2018, que teve o condão de expor a adequação do entendimento do órgão com relação às principais categorias de itens que costumam gerar discussões sobre o enquadramento como insumo.
Em nossa opinião, esse propósito não foi atendido por completo, pois o Parecer Normativo da RFB possui alguns critérios restritivos contraditórios à decisão do STJ. Mas esse não é o tema central desta abordagem, pois, além de reproduzido em outras ocasiões[1], referido parecer não vincula os integrantes do Carf.
Pois bem.
Os Ministros do STJ, no julgamento do Recurso Especial 1.221.170/PR, definiram que os bens e serviços que sejam essenciais e/ou relevantes à atividade econômica desempenhada pelo contribuinte devem ser considerados insumos para fins de aproveitamento de créditos de PIS e Cofins, conceito supostamente reproduzido pela Receita Federal no Parecer Normativo Cosit nº 5/2018.
Há quem defenda que a decisão da Corte Superior expande o direito ao crédito das contribuições e possibilita, por exemplo, que um comerciante possa apurar créditos de PIS e Cofins sobre itens “essenciais e/ou relevantes à atividade econômica”, tais como sacolas plásticas e despesas com cartão de crédito.
Parece-nos, nessa questão, uma interpretação distorcida da decisão, pois naquela ocasião os Ministros da Primeira Seção do STJ analisaram o direito ao crédito de PIS e Cofins à luz do artigo 3º, inciso II das Leis 10.637 e 10.833, que diz respeito a “bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda”.
Dessa forma, os critérios de essencialidade ou relevância definidos pelo STJ devem ser observados pelo contribuinte para identificar se determinado item, desde que utilizado na produção de bens destinado à venda ou na prestação de serviços, pode ser classificado como insumo para fins de créditos de PIS e Cofins. É o que se depreende da leitura de excerto do voto da Ministra Regina Helena Costa:
“Nesse cenário, penso seja possível extrair das leis disciplinadoras dessas contribuições o conceito de insumo segundo os critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte (…)
Demarcadas tais premissas, tem-se que o critério da essencialidade diz com o item do qual dependa, intrínseca e fundamentalmente, o produto ou o serviço, constituindo elemento estrutural e inseparável do processo produtivo ou da execução do serviço, ou, quando menos, a sua falta lhes prive de qualidade, quantidade e/ou suficiência.
Por sua vez, a relevância, considerada como critério definidor de insumo, é identificável no item cuja finalidade, embora não indispensável à elaboração do próprio produto ou à prestação do serviço, integre o processo de produção, seja pelas singularidades de cada cadeia produtiva (v.g., o papel da água na fabricação de fogos de artifício difere daquele desempenhado na agroindústria), seja por imposição legal (v.g., equipamento de proteção individual – EPI), distanciando-se, nessa medida, da acepção de pertinência, caracterizada, nos termos propostos, pelo emprego da aquisição na produção ou na execução do serviço.”
Com essas premissas, uma série de dispêndios, que são indiscutivelmente essenciais ou relevantes para a atividade econômica da empresa, podem não preencher os requisitos para o direito ao crédito de PIS e Cofins conforme a decisão do STJ, pois não são utilizados na fabricação de bens destinados à venda ou na prestação de serviços (a exemplo das sacolas plásticas).
Em outras palavras, quando o tema é créditos de PIS e Cofins, entendemos que o contribuinte deve ficar atento não só às despesas que estão expressamente previstas em lei ou que se enquadram no conceito de insumo à luz da decisão do STJ (REsp nº 1221170). É preciso que o contribuinte se atente também às despesas que, dada a sua essencialidade ou relevância em sua atividade, mereça melhor análise pelos nossos tribunais quanto ao direito ao crédito das contribuições.
Vale ressaltar que o critério da essencialidade ou relevância aplicável aos insumos não nasceu com a não cumulatividade das contribuições, instituída primeiramente para o PIS com a Medida Provisória nº 66 de 29.8.2002, mas se consolidou depois de mais de 15 anos de regime não cumulativo.
Nesse sentido podemos citar como exemplo o frete de transferência de produtos acabados entre estabelecimentos da mesma empresa. A jurisprudência no âmbito da RFB é unânime no sentido de que essas despesas não geram direito ao crédito das contribuições. A decisão do STJ também não contempla referida despesa, pois incorre depois de finalizado o processo produtivo.
Contudo, uma logística eficiente muitas vezes envolve um Centro de Distribuição, filial da empresa, sendo que o frete de transferência está relacionado ao processo de entrega dos produtos da empresa aos clientes. Em tempos de isolamento social e aumento do e-commerce, a essencialidade desse frete se torna ainda mais evidente.
Compre-nos lembrar que o direito ao crédito de PIS e Cofins sobre o frete de compras nunca esteve expressamente previsto na legislação, mas de longa data a RFB entende que referida despesa compõe o custo de aquisição das mercadorias e por isso permite o aproveitamento do crédito.
Seguindo esse raciocínio, não poderíamos interpretar que o frete de transferência de produtos acabados da fábrica para o CD, por exemplo, teria o direito de crédito suportado pelo inciso IX do artigo 3º da Lei 10.833 (armazenagem de mercadoria e frete na operação de venda)?
Ainda falando sobre os tempos difíceis de pandemia em que vivemos, a Ministra Regina Helena Costa esclarece em seu voto que a “relevância, considerada como critério definidor de insumo, pode ser identificada embora não indispensável à elaboração do próprio produto ou à prestação do serviço, integre o processo de produção, seja pelas singularidades de cada cadeia produtiva (v.g., o papel da água na fabricação de fogos de artifício difere daquele desempenhado na agroindústria), seja por imposição legal (v.g., equipamento de proteção individual – EPI),”.
Evidente que esse critério não alcança custos incorridos no setor administrativo, comercial ou até mesmo de expedição de produtos. Entretanto, atualmente existem diversas exigências legais para que as empresas possam desempenhar suas atividades (uso de máscara, álcool em gel, demarcação de distanciamento, entre outras).
Sem esses custos – não amparados pela decisão do STJ – as empresas não podem desempenhar suas atividades. Ao nosso ver, esse cenário favorece em muito o direito de o contribuinte apurar créditos de PIS e Cofins, mas falta respaldo legal para ampará-lo.
Nesse contexto, nosso objetivo é estimular uma reflexão: sua empresa já parou para analisar sobre valores que têm plena convicção quanto a sua essencialidade para desenvolvimento da atividade econômica, mas está deixando de apropriar créditos de PIS e Cofins pela falta de previsão expressa na legislação ou de uma jurisprudência consolidada?
Em nossa opinião, cabe aos contribuintes avaliarem criteriosamente esse cenário e, de forma fundamentada e caso a caso, buscar que esse direito seja reconhecido.
[1] http://www.athros.com.br/creditos-de-pis-e-cofins-sobre-despesas-incorridas-no-desenvolvimento-de-novos-produtos/