Pedro Cesar da Silva
CEO
Athros Auditoria e Consultoria + SFAI
O Projeto de Lei que reformula a tributação do Imposto de Renda (PLP 1087/25) foi recentemente aprovado por unanimidade na Comissão Especial da Câmara, que analisava a proposta. O deputado Arthur Lira , relator do PLP, fez ajustes em relação ao parecer anterior e retomou a previsão do mecanismo de compensação para evitar a sobreposição de tributos sobre lucros e dividendos.
O próximo passo é levar o PLP para discussão no Plenário da Câmara, onde há oportunidade para introduzir modificações em relação ao texto produzido pelo deputado Arthur Lira e aprovado pela Comissão Especial.
Em relação à versão originalmente apresentada pelo Governo ocorreram algumas mudanças, no entanto, podemos considerar que houve uma vitória do Governo já que a essência do projeto foi mantida.
Nesse contexto, é importante analisarmos as propostas do PLP , considerando o texto do substitutivo produzido pelo deputado Arthur Lira e aprovado pela Comissão Especial.
A espinha dorsal do PLP é isentar do imposto de renda quem recebe rendimentos de até R$ 5 mil e propiciar redução do imposto sobre rendimentos entre R$ 5.000,01 e R$ 7.350,00 (na versão original do Projeto de Lei R$ 7.000,00).
Para compensar os efeitos da desoneração foram mantidas as normas propostas originalmente, com alguns ajustes, ou seja, estabelecendo tributação na fonte de 10% sobre distribuição de lucros para pessoas físicas e para sócios estrangeiros e criando uma taxação mínima pelo imposto sobre a renda de 10%.
Assim, para rendimentos anuais superiores a R$ 600.000,00, será aplicada uma alíquota mínima de IR progressiva, chegando a 10% para valores que ultrapassem R$ 1.200.000,00 por ano, criando dessa forma o Imposto de Renda das Pessoas Físicas Mínimo- IRPFM.
Adicionalmente, o PLP prevê tributação antecipada de 10%, mediante retenção na fonte, sobre lucros e dividendos distribuídos mensalmente por uma mesma fonte pagadora, quando superiores a R$ 50.000,00,
Chama a atenção negativamente o fato de que a retenção na fonte abrangerá a integralidade do valor distribuído e não somente o que superar R$ 50.000,00.
Para a apuração do IRPFM é necessário considerar as seguintes etapas:
- Apuração do total de rendimentos;
- Definição da alíquota aplicável;
- Apura-se o IRPFM devido com as deduções previstas
Para maior clareza passo a comentar cada etapa:
Apuração do total de rendimentos
O PLP determina que serão considerados, para fins do IRPFM, todos os rendimentos recebidos no ano-calendário, inclusive os tributados de forma exclusiva ou definitiva e os isentos ou sujeitos à alíquota zero ou reduzida.
O substitutivo do deputado Arthur Lira corrigiu uma falha da versão original ao deixar claro que será o resultado da atividade rural (receitas menos despesas) e não o total das receitas que devem ser consideradas.
Quanto às deduções permitidas para a determinação do total de rendimentos também tivemos ajustes que contribuíram para um texto nitidamente aprimorado, vejamos:
- (i) ganhos de capital, exceto os obtidos em operações realizadas em bolsa ou no mercado de balcão organizado sujeitas à tributação com base no ganho líquido, no Brasil;
- (ii) rendimentos recebidos acumuladamente tributados exclusivamente na fonte, desde que o contribuinte não tenha optado pelo ajuste anual;
- (iii) valores recebidos por doação em adiantamento da legítima ou herança;
- (iv) rendimentos auferidos em contas de depósitos de poupança e a remuneração produzida por títulos e valores mobiliários, destacando-se os títulos típicos do mercado imobiliário (LCI e CRI dentre outros), os típicos do setor agrícola (CDA e CRA dentre outros) e os típicos dos projetos de investimento e infraestrutura.
- (v) rendimentos distribuídos pelos Fundos de Investimento Imobiliário e nos Fundos denominados como Fiagro;
- (vi) valores recebidos a título de indenização por acidente de trabalho, por danos materiais ou morais, ressalvados os lucros cessantes;
- (vii) valor de diárias, alimentação, transporte e similares.
- (viii) os rendimentos de títulos e valores mobiliários isentos ou sujeitos a alíquota zero do imposto sobre a renda, exceto os rendimentos de ações e demais participações societárias
- (ix) os lucros e dividendos relativos a resultados apurados até o ano-calendário de 2025 quando a distribuição tenha sido aprovada até 31/12/2025, desde que seu pagamento, crédito, emprego ou entrega tenha ocorrido nos termos originalmente previstos no ato de aprovação.
Destaca-se que mesmo que a MP 1.303/25 seja aprovada com a tributação de 5% dos rendimentos dos títulos ligados ao setor imobiliário, rural e de infraestrutura, os respectivos rendimentos não farão parte dos rendimentos para determinação do enquadramento ou não do contribuinte como “alta renda”.
Não menos importante é a previsão da possibilidade de não incluir na base de cálculo os lucros e dividendos cuja distribuição tenha sido aprovada até 31/12/2025.
Penso que essa previsão poderia ter sido ainda mais assertiva no sentido de considerar todo o lucro apurado até 31/12/2025 independentemente de ter sua distribuição aprovada ou não.
Nesse esteio entendo que há espaço para judicialização, pois não é adequado que o lucro gerado até 31/12/2025 sob a égide da atual legislação seja submetido à tributação decorrente de legislação vigente posteriormente a sua geração.
Outro aspecto preocupante é que além da aprovação da distribuição até 31/12/2025 a norma inclui exigência de que o pagamento ou crédito tenha ocorrido nos termos originalmente previstos.
Definição da Alíquota
A alíquota do IRPFM será definida com base na tabela abaixo:
Renda Anual | Cálculo da Alíquota Mínima | Alíquota Final | Imposto Mínimo a Pagar |
R$ 600.000 | (600.000 – 600.000) / 600.000 × 10% | 0% | Nada |
R$ 750.000 | (750.000 – 600.000) / 600.000 × 10% | 2,50% | R$ 18.750 |
R$ 900.000 | (900.000 – 600.000) / 600.000 × 10% | 5% | R$ 45.000 |
R$ 1.050.000 | (1.050.000 – 600.000) / 600.000 × 10% | 7,50% | R$ 78.750 |
R$ 1.200.000 | (1.200.000 – 600.000) / 600.000 × 10% | 10% | R$ 120.000 |
Apura-se o IRPFM devido com as deduções previstas
Após a apuração do IRPFM com base nas alíquotas definidas na tabela acima poderão ser feitas as seguintes deduções:
- > imposto de renda das pessoas físicas devido na declaração de ajuste anual;
- > imposto de renda exclusivo na fonte incidente sobre os rendimentos incluídos na base de cálculo do IRPFM
- > imposto de renda apurado sobre investimentos no exterior ou participação em offshore
- > imposto de renda definitivos sobre rendimentos computados na base de cálculo do IRPFM
- > redutor do IRPFM
Sobre as deduções previstas, a que chama mais atenção é o redutor, o qual será aplicado caso a soma da alíquota efetiva da tributação do lucro da pessoa jurídica fonte pagadora de lucros com a alíquota efetiva do IRPFM ultrapasse as alíquotas nominas do IRPJ e CSLL da fonte pagadora.
Nesse contexto, nunca é demais lembrar os comentários do ilustre Jurista Prof. Dr. Fernando Facury Scaff, em artigo publicado pela Conjur:
“O ponto sob análise é a verdadeira “tucanagem” que foi feita para tributar os dividendos, isto é, os lucros que as empresas distribuem aos seus sócios ou acionistas, para compensar a redução da arrecadação. O que está sendo feito é criar uma tributação disfarçada de dividendos, o que acarretará o retorno da distribuição disfarçada de lucros. De farsa em farsa, demonstremos o que está ocorrendo.”
A opção do Governo por não enfrentar objetivamente a oneração dos dividendos parece ser uma forma de contornar a necessária discussão da redução da alíquota dos tributos sobre o lucro da pessoa jurídica (IRPJ e CSLL), afinal, por óbvio, ao tributar os dividendos haverá uma sobreposição, pois o mesmo lucro que seria tributado quando distribuído pela pessoa física, já foi onerado quando apurado pela pessoa jurídica.
Na tentativa de amenizar as críticas em relação ao descrito no parágrafo anterior foi criado um complexo critério de redução do IRPFM calculado sobre os lucros e dividendos considerados na base de cálculo do IRPFM.
Assim, haverá um redutor do IRPFM, caso a alíquota efetiva do IRPFM somada à alíquota efetiva da pessoa jurídica pagadora de lucros e dividendos resultar em percentual superior a 34% para as atividades em geral e outros percentuais para atividades específicas.
Interessante observar que a pessoa física para determinar o redutor terá que ter conhecimento da alíquota efetiva dos impostos sobre o lucro da pessoa jurídica, assim, é possível que essa informação venha a ser requerida nos informes de rendimentos a ser emitidos pelas pessoas jurídicas que pagarem ou creditarem lucros.
Também não vejo clareza na norma na hipótese do recebimento de lucros de inúmeras fontes pagadoras.
Merece críticas o redutor levar em conta a alíquota nominal das pessoas jurídicas, que para as empresas em geral é de 34%, ou seja, superior a maior alíquota nominal das pessoas físicas que é de 27,5%.
Seria mais crível se o projeto tivesse enfrentado de forma direta o fim da isenção da distribuição dos lucros e dividendos, mas que em contrapartida, em respeito à lógica e equilíbrio tributário, propusesse a redução da tributação sobre o lucro das pessoas jurídicas.
Concluo, portanto, que alguns ajustes ainda são necessários para aprimorar o substituto do PLP apresentado pelo relator deputado Arthur Lira, dentre elas destaco a não incidência sobre a totalidade dos lucros gerados até 31/12/2025 e ter como limitador para fins de cálculo da redução do IRPFM a alíquota máxima da pessoa física (27,5%) e não a alíquota nominal das fontes pagadoras de lucros.