A Nova Lei do IRPF: Alívio para Muitos, Preocupação para Todos

Luciano Nutti

Sócio-Diretor – Tributos Diretos

Athros Auditoria e Consultoria + SFAI

A Lei nº 15.270/25, publicada no DOU de 27/11/2025, ampliou a faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física – IRPF para contribuintes de baixa renda, instituindo, em contrapartida, uma tributação mínima para pessoas físicas classificadas como de alta renda.

Fruto da conversão do Projeto de Lei nº 1.087/2025, de iniciativa do Poder Executivo, referida Lei atende a uma promessa de campanha do presidente Lula, em especial quanto à ampliação da isenção do IRPF, com aprovação histórica por unanimidade nas duas Casas Legislativas.

A aprovação unânime se justifica pela proximidade das eleições, uma vez que não há interesse político em se posicionar contra uma medida de forte apelo popular. A iniciativa beneficiará milhões de brasileiros, enquanto os impactos negativos recairão sobre um grupo relativamente restrito de contribuintes de alta renda.

As alterações trazidas pela Lei podem ser resumidas nos seguintes pontos:

Redução mensal do IRPF

O benefício de redução do IR mensal será aplicado da seguinte forma:

  • > Até R$ 5.000,00: redução de até R$ 312,89, de modo que o imposto devido seja zero.
  • > De R$ 5.000,01 a R$ 7.350,00: redução decrescente, calculada pela fórmula
    978,62 – (0,133145 × rendimentos tributáveis sujeitos à incidência mensal), até zerar em R$ 7.350,00.
  • > Acima de R$ 7.350,00: não há redução.

Redução anual do IRPF

A partir do exercício de 2027 (ano-calendário de 2026), aplica-se:

  • > Até R$ 60.000,00: redução de até R$ 2.694,15, zerando o imposto devido.
  • > De R$ 60.000,01 a R$ 88.200,00: redução decrescente segundo a fórmula
    8.429,73 – (0,095575 × rendimentos tributáveis sujeitos ao ajuste anual), até zerar em R$ 88.200,00.
  • > Acima de R$ 88.200,00: não há redução.

A nova legislação também eleva o limite anual de descontos, de R$ 16.754,34 para R$ 17.640,00, a partir de 2026.

Retenção mensal sobre lucros e dividendos distribuídos

  • > Pagamentos mensais a pessoas físicas residentes no Brasil: retenção na fonte de 10% sobre valores acima de R$ 50.000,00, por pessoa física e por fonte pagadora;
  • > Pagamentos ou remessas ao exterior: retenção de 10%, sem limite mínimo. A incidência alcança tanto beneficiários pessoas físicas quanto pessoas jurídicas no exterior, medida que pode afugentar investimentos do País.

Contribuintes estrangeiros poderão utilizar crédito (ainda não regulamentada a forma) quando a soma do IRPJ/CSLL da fonte pagadora e da retenção de 10% exceder as alíquotas nominais brasileiras (34% – regra geral), devendo ser observadas ainda as regras de cada jurisdição e tratados internacionais para eventual compensação do imposto retido.

Obviamente, as distribuições de lucros mensais que referirem-se ao ano de 2025 e anteriores, devidamente deliberados e aprovados, conforme trataremos adiante, não sofrerão retenção.

Tributação mínima para contribuintes de alta renda

Instituiu-se uma alíquota mínima aplicável a contribuintes com rendimentos anuais superiores a R$ 600.000,00. A base de cálculo abrange praticamente todos os rendimentos, incluindo isentos e tributados exclusivamente na fonte, com algumas exceções, tais como:

  • > Ganhos de capital (exceto operações em bolsa);
  • > Doações, adiantamentos da legítima e herança;
  • > Rendimentos de poupança e de determinados títulos isentos (LCI, LCA, CRI, CRA, LIG, CDCA, FIIs, Fiagros com mais de 100 cotistas, dentre outros);
  • > Indenizações por acidente de trabalho, danos materiais ou morais;
  • > Lucros e dividendos relativos a resultados apurados até 2025, desde que aprovados e deliberados até 31/12/2025, e pagos entre 2026 e 2028, nos moldes da deliberação.
  • > Dentre outras.

A alíquota mínima será de:

  • > 10% para rendimentos iguais ou superiores a R$ 1.200.000,00;
  • > Crescimento linear de 0% a 10% para rendimentos entre R$ 600.000,01 e R$ 1.200.000,00, conforme a seguinte fórmula: Alíquota (%) = (REND ÷ 60.000) – 10.

Poderão ser deduzidos da tributação mínima os valores de IRRF pagos sobre os rendimentos incluídos na base de cálculo.

A Lei prevê ainda um redutor quando a soma da alíquota efetiva de IRPJ/CSLL da pessoa jurídica com a alíquota efetiva da tributação mínima do IRPF superar as alíquotas nominais (como regra geral, 34%, salvo exceções).

Críticas ao Projeto / Lei

Embora tenha havido aprovação unânime, no decorrer da votação nas duas casas foram apresentadas inúmeras emendas propondo a atualização da tabela progressiva do IRPF, do valor isento da atividade rural e dos valores-base da tributação mínima, o que sem dúvida seria muito mais adequado, à medida que beneficiaria também outros contribuintes. O relator, contudo, rejeitou estas propostas, argumentando que a atualização da tabela progressiva possui uma defasagem histórica e que o tema deveria ser tratado em momento futuro, num contexto de discussão mais amplo envolvendo uma profunda reforma da tributação da renda no Brasil.

Neste quesito, a Lei firma um compromisso do Poder Executivo em enviar, em até um ano, um projeto de lei com uma política nacional de atualização dos valores do IRPF.

Outras emendas rejeitadas buscavam alterar a forma como o redutor da tributação mínima seria aplicado a empresas que gozam de incentivos ou outros regimes tributários, cuja alíquota mínima é bem inferior a 34%. Tecnicamente, argumentava-se que o tratamento favorecido conferido à pessoa jurídica eliminaria, total ou parcialmente, o efeito do redutor da tributação mínima da pessoa física — o que, de fato, ocorrerá. O relator justificou a rejeição dessas emendas afirmando que o objetivo é tributar pessoas físicas com alíquota efetiva baixa, ainda que os lucros tenham sido gerados por pessoas jurídicas beneficiadas. Trata-se de um contrassenso evidente. Indiretamente, essa opção esvazia o benefício concedido à pessoa jurídica, ainda que o respectivo impacto seja transferido para a pessoa física dos sócios.

Ainda em relação à alíquota efetiva, outra crítica cabível é que será apurada com base no lucro contábil, inclusive para as empresas submetidas ao regime de tributação do lucro real, o que distorcerá totalmente os cálculos.

Uma crítica adicional, pouco debatida, diz respeito ao próprio desenho da tributação mínima. A forma como foi estruturada tende a penalizar contribuintes que, embora recebam lucros distribuídos inferiores a R$ 600.000,00 no ano, possuem outras fontes de rendimento. Isso ocorre porque o limite para incidência da tributação mínima considera a soma de praticamente todos os rendimentos do contribuinte — inclusive aqueles que permanecerão isentos — fazendo com que o patamar seja atingido com muito mais facilidade. Aluguéis, aplicações financeiras, ganhos de capital na venda de ações, entre outros, passam a compor a base de cálculo e podem elevar o contribuinte ao nível de alta renda mesmo quando a distribuição de lucros, isoladamente, seja inferior ao limite legal.

Entre as críticas ao projeto — agora convertido em lei — uma das mais relevantes diz respeito ao tratamento dado aos lucros gerados antes da entrada em vigor das novas regras. A legislação preserva a isenção para lucros apurados até 31/12/2025 somente se a deliberação ocorrer até essa mesma data e desde que os pagamentos sejam realizados entre 2026 e 2028, nos moldes da deliberação. Surge, então, uma inconsistência evidente: como deliberar sobre um lucro cujo valor ainda é desconhecido? Trata-se de uma exigência que, na prática, demanda um exercício de previsão contábil incompatível com a própria dinâmica de apuração de resultados, que é concluída apenas no ano subsequente.

Essa exigência gerou um movimento intenso por parte das empresas, cada qual buscando soluções específicas diante de um cenário de elevada insegurança jurídica e alta dificuldade operacional para tomada de decisão.

Com o intuito de mitigar o problema, o senador Eduardo Braga (MDB) apresentou relatório instantes antes da sanção presidencial do PL 1.087/25, propondo a alteração do dispositivo por meio do Projeto de Lei nº 5.473/2025, atualmente em tramitação na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). A proposta estende o prazo para deliberação até 30/04/2026, o que sem dúvida seria muito mais adequado. Nas palavras do senador, a redação original “acarreta uma impossibilidade material e jurídica para a maioria dos contribuintes, uma vez que o encerramento contábil do exercício de 2025 e a consequente deliberação sobre a destinação do lucro líquido somente ocorrem no exercício subsequente”.

Sem dúvida, a medida é oportuna e indispensável, podendo resolver um dos aspectos mais delicados e de difícil aplicação da nova legislação. Contudo, mesmo que essa questão seja efetivamente superada — o que esperamos — a Lei nº 15.270/25 está longe de refletir um modelo adequado, e ainda mais distante de merecer o título de Reforma Tributária do Imposto de Renda.

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